quinta-feira, 27 de abril de 2017

Políticas Públicas para a Educação Infantil: uma breve análise das pesquisas sobre qualidade nas perspectivas americana e brasileira

Estou cursando uma disciplina sobre políticas públicas em Educação Infantil em uma universidade americana esse semestre. Nesse curso, tenho tido acesso a várias pesquisas sobre como se dão as políticas públicas nesse país e como buscam medir o efeito delas.

Existem muitos programas para a Educação Infantil nos Estados Unidos, alguns poucos federais, como o Head Start destinado à crianças com famílias de baixa renda. Mas a maioria dos programas são estaduais, e nessa seara tem vários propostas desde de “vouchers” pra instituições particulares até programas informais de atendimento.

Nessa complexidade e variedade de atendimento, são muitas as pesquisas que buscam avaliar o impacto desses programas. O que mais tem se sobressaído nas leituras a que tenho tido acesso são as pesquisas que buscam medir efeitos da Educação Infantil a longo prazo, ou seja aquelas que medem o resultado das experiências das crianças nessa etapa para a vida posterior dos sujeitos. Nessas pesquisas, parece haver um consenso de que a crianças de baixa renda que frequentam a pré-escola com “alta qualidade” [1]mostram melhores rendimentos acadêmicos, tem acesso a melhores empregos e há uma diminuição de gravidez na adolescência e de atividades criminosas quando adultos. Há em geral um levantamento grande de dados sobre a situação econômica e estrutural das famílias ao longo do tempo e uma infinidade de testes são aplicados nas crianças desde a Educação Infantil até a adolescência.

O impacto dos resultados dessas pesquisas nas políticas públicas não é unânime entre os pesquisadores, mas parece haver um consenso de que para medir qualidade é preciso fazê-lo de forma objetiva, por meio de “dados precisos”.  Há por trás dessa perspectiva uma visão positivista que considera que a “boa” e confiável ciência é aquela que se mede por meio de surveys e dados numéricos.  
Organismos internacionais e alguns pesquisadores no Brasil, principalmente aqueles que partem da ideia de “criança como investimento” tem se alimentado e replicado essa lógica. São várias as propostas de avaliação em larga escala do desenvolvimento infantil nas instituições de Educação Infantil baseadas nessa perspectiva no país.

Por outro lado, outras pesquisas e documentos oficiais nacionais brasileiros, revelam uma outra lógica de investigação e de qualidade na Educação Infantil. Baseadas em estudos europeus, especialmente a partir das contribuições de Peter Moss, Aldo Fortunati entre outros e nos estudos da sociologia e antropologia da infância, trazem uma outra perspectiva para a medição de qualidade: “ a negociada”. Ainda que existam parâmetros e indicadores, é preciso escutar como os sujeitos significam essa qualidade, inclusive para aperfeiçoar esses indicadores que não são estáticos nem neutros e trazem em seu bojo uma visão de infância e de Educação Infantil.

A experiência do município de São Paulo entre os anos de 2014 e 2016, na construção dos “Indicadores  de Qualidade da Educação Infantil Paulistana” é reveladora dessa outra lógica. A partir de indicadores de qualidade levantados pelos documentos nacionais, diferentes segmentos (funcionários, familiares e por vezes, crianças) das instituições de Educação Infantil da cidade fizeram uma auto-avaliação das unidades e recriaram os indicadores ali presentes. As diferentes vozes foram escutadas, trazendo para as instituições um papel político na discussão sobre a infância na sociedade e na gestão democrática das unidades. Ainda que a metodologia possa ser aperfeiçoada e que seja necessário a criação de uma cultura de avaliação participativa, a proposta traz uma importante mensagem: as vozes dos sujeitos precisam ser consideradas quando se trata de avaliar qualidade,  inclusive a dos bebês e das crianças. O que parece estar longe do horizonte americano!

Olhando para essas diferentes perspectivas sobre medição da qualidade na Educação Infantil, vem à mente uma questão de fundo: Para pensar qualidade, é preciso pensar  o que se espera da Educação Infantil. A Educação Infantil se constitui uma panaceia para resolver problemas sociais? Trata-se de melhoria do desempenho acadêmico nas séries iniciais e posteriores (leia-se linguagem oral, escrita e matemática)? Trata-se de garantir que as crianças vivam uma boa infância? É uma iniciação à cultura humana, suas diferentes linguagens e suas formas de ser e estar no mundo? Essas alternativas são excludentes? Em que medida?

Concepções de infância, Educação Infantil,  de pesquisa e de quais são os sujeitos que devem ter suas vozes legitimadas (pesquisadores, profissionais, familiares e/ou crianças) induzem as políticas públicas. E políticas públicas afetam diretamente o cotidiano das instituições de Educação Infantil e as experiências as quais as crianças são submetidas.  

[1]não há consenso sobre o que seria isso, mas a tendência é considerá-la a partir de testagens em larga escala do desenvolvimento infantil)




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